A libertação de Bernardo
Bernardo entrou no seu quarto. Deitou na cama. Levantou-se.
Passeou pelo quarto pensando no que faria. Não que fosse tímido, mas medroso.
Tinha medo dos seus sentimentos, tinha medo de expô-los, de estar enganado, de
fantasiar uma realidade que não existia, mas aqueles sentimentos bons já
estavam o machucando, deixando-o louco, sonhando com um futuro que só existia
na sua cabeça, ou melhor, no seu coração.
Andou mais um pouco em um vai e
vem apressado pelo quarto. Até que nessas voltas parou e olhou para a
escrivaninha de madeira que ficava na frente da janela que tinha a vista para o
jardim. A escrivaninha não era nova, no entanto era conservada, com duas
gavetas na lateral, um punhado de canetas dentro de um baldinho de alumínio
azul, uma luminária branca e umas cinco a seis folhas brancas sobre a mesma.
Bernardo fitou aquelas folhas, aquelas canetas por um tempo. Não possuía a
coragem suficiente para dizer os sentimentos que movia a sua vida por aqueles
meses, então decidiu que usaria da escrita para livra-se daquelas
alegrias-dores e assim poder olhar para o futuro e para um novo que precisava
chegar.
Então puxou a cadeira. Pegou uma
caneta azul. Encarou a folha limpa, branca e imaculada e não sabia por onde
começar. Qual seria a melhor palavra para iniciar uma libertação?
Posicionou a caneta, tinha tanta
coisa para pôr naquele papel, porém se questionava onde se iniciará aquele
amor. Decidiu colocar uma música para abri as portas do seu coração, ordenar
seus sentimentos e expor a sua alma. Pegou seu celular e os fones de ouvido.
Selecionou algumas músicas que tinham em seus arranjos muitos instrumentos de
sopro, ele gostava do som que o vento fazia ao ser controlado nas saídas desses
instrumentos e principalmente escolheu canções que conseguiam traduzir todas as
alegrias-dores, criando uma playlist nomeada de liberdade. A primeira música
foi a que marcou o iniciou de tudo aquilo que hoje ele vivia. Falava das
batidas do coração, do observar o caminhar, dos sorrisos que roubam palavras,
da presença marcante da pessoa que você gosta. Traduzia muito bem os primeiros
sentimentos despertados dentro da alma de Bernardo. Pegou novamente a caneta,
olhou para o jardim, naquele dia de outono, com muitas folhas ao chão, formando
um belo tapete amarelo e laranja. Existia uma brisa suave que podia senti na
pequena abertura de sua janela e contemplava a delicadeza com que ela retirava
as folhas dos galhos da cerejeira. Refletia como era natural o recomeço na
existência terrena. Como era normal cair, como era normal morrer para que uma
nova vida surja e um novo tempo se inicie.
Olhou o papel a sua frente e ao
observar tudo aquilo ao som do controle do vento pelos instrumentos de sopro
eis que dentro dele sentimentos de liberdade e recomeço começavam a acelerar
seu coração no mesmo ritmo da canção que escutava. A alma agora já sabia o que
dizer. A coragem que até então era ausente começa a impulsiona-lo a ter
atitude e controle sobre o seu destino. Trocou a caneta azul por uma
caneta preta no modelo bico de pena, amassou a folha em suas mãos e a abriu novamente
esticando-a sobre a escrivaninha, agora cheia de curvas, marcas e elevações. E
sim. Agora Bernardo já sabia como começar, ou melhor ainda, já sabia como
terminar.
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